O nazi-facismo na TV

Por Fernando Schweitzer
de Buenos Aires em 16/2/2010


Que conteúdo útil na televisão tupiniquim está cada vez mais raro seria redundante, caso não tivéssemos esta semana – no famigerado reality de heróis do Pedro Bial e espero que apenas para ele – chegado ao cúmulo da ignorância e desinformação. O programa BBB 10 mostrou um exemplo de o quanto em uma sociedade pseudo-pós-moderna o preconceito e a desinformação ainda persistem como falsas-verdades, como diria Chico Buarque em A Gota d´água.

Marcelo Dourado, depois de tantas imbecilidades que proferiu durante sua segunda participação no reality global, mostrando que poderia piorar sua imagem bucéfala diante de uma audiência esquálida e acrítica. Ao meio de seus brothers no programa de maior audiência da TV brasileira na atualidade proferiu que heterossexuais não contraem HIV, causando revolta entre os moradores da casa do Big Brother Brasil.

Depois da exibição da cena, o apresentador Bial lembrou que os participantes falam besteiras e que para saber mais sobre o contágio da doença os espectadores deveriam entrar no site do Ministério da Saúde. Salvo-conduto para o jornalista? Jamais. Além das tribos semitistas em sua "divisões", que de antemão rotularam os partícipes do tal show de realidade, novamente a Rede Globo demonstra o quanto é reacionária e conservadora.


A apologia do hetero

Pensemos, caríssimos, o politicamente correto "foi feito", mas o estrago não foi desfeito. Pois simplesmente dizer que se alguém queira se informar que acesse o site do Ministério de Saúde é omissão, ademais sonegação de informação, num país onde um dos projetos do governo federal é justamente a inclusão digital e da, polêmica para alguns, disseminação do acesso à banda larga. Ou seja, somos em torno de 40 milhões de usuários de internet em um país de 200 milhões. E penso ainda que um jornalista deve ter um compromisso com a verdade e a atitude omissa do senhor Pedro Bial não desmentiu a falácia do "herói" homofóbico Marcelo Dourado.

Darei sugestões rápidas, estas disponíveis no site www.aids.gov.br, que poderiam ter sido utilizadas pelo tão reverenciado apresentador e que qualquer pessoa dita esclarecida já sabe há anos:

1) Fornecer o site específico disponibilizado pelo Ministério da Saúde, o mesmo que citei acima. Seria omisso, mas ao menos a pessoa não se perderia nos milhões de temas e propaganda do governo que existem no site principal do Ministério.

2) Poderiam se perder alguns míseros 30 segundos dentro do mar de conteúdos úteis dizendo uma obviedade quanto aos grupos de risco relacionados à pandemia do vírus HIV, dos quais homossexuais hoje são o menor grupo de contágio e contagiados, e nos economizar de seus provérbios enfadonhos para enaltecer seus "heróis". Cito a definição do portal do Ministério da Saúde, o Aids.com.br: "Relação sexual (homo ou heterossexual) com pessoa infectada, sem o uso de preservativos; compartilhamento de seringas e agulhas, principalmente, no uso de drogas injetáveis; transfusão de sangue contaminado pelo HIV; reutilização de objetos perfuro-cortantes com presença de sangue ou fluidos contaminados pelo HIV."

3) Eliminar ou ao menos punir o jogador do reality, por má conduta, propagação de preconceito e crime de ódio e talvez quiçá apologia à heterossexualidade em uma psicologia já utilizada pelos nazistas. Pois, assim como os nazistas, se tratar alguma "minoria", essa que segundo o IBGE são 10% da população, é, sim, um ato de apologia ao preconceito sócio-normativo de que ser hetero é bom e homossexual é ruim.



Ministério Público deveria ser firme

O crime de ódio só não se acentua mais porque nosso Congresso conservador não tem a honradez de aprovar a PCL 122, está que dentre outras coisas criminaliza a homofobia. Além do engavetamento eterno da Lei Marta Suplicy de união civil, que já está aprovada há anos em países do Mercosul como Argentina(2001) e Uruguai (2003), onde a lei também desde 2005 permite o matrimônio e adoção por casais do mesmo sexo. Além de países como México (2001), Colômbia(2009) que também têm leis de descriminalização do aborto.

O atraso na votação e aprovação de leis sobre direitos civis são o escudo protetor dos neo-nazistas no país. Hoje colaboram a pretextos múltiplos, do tipo "Temos que discutir mais sobre o tema". Aí, inimigos se juntam em favor do atraso e da discriminação, sejam os grupos de ultra-direita como DEM, PP, PSDB e direitistas nanicos como PR, Prona etc., ajuntados a seus rivais políticos mais aliados sociológicos pela exclusão de setores do PT, PCdoB que, mesmo em suas bases possuindo muitos homossexuais, pragmaticamente não entram internamente nem externamente nessa discussão, pois internamente são ainda muito arcaicos e focados apenas na discussão político-partidária. E antes da acusação meu pedido de redenção, sim, existem exceções em todos os lados. Poucas, mas há.

Minha lástima neste caso não é pela esperança de que o Brasil se torne menos exclusor, racista, nazista e fascista. Mesmo porque se nossa concessão pública historicamente mais degradadora desta quase nação, após a "redemocratização", não foi punida nem recebeu sanções por ser instrumento e apoiador da criminosa ditadura militar que tivemos, a mais longa da América Latina, só não comparada às portuguesa, francesa e espanhola (em período de tempo, obviamente, e não em número de mortos, que nesse quesito ganhamos em disparada), um fato absurdo deste além de digerido como normal pela massa acéfala que a faz líder de audiência desde 1967, se tornará uma mentira repetida a ser considerada verdade.

É de agonizar que em um país onde tantos já foram mortos por crimes de ódio, a principal concessão pública brasileira faça um desserviço público. E se tanto o Ministério Público diz vigiar, quase como um sensor dos anos de chumbo, modificando programas de outras emissoras de canal etc. Este mesmo órgão deveria atuar firmemente neste caso. Pelo argumento do próprio que diz que a TV precisa de regulação pelo bem da nação, pois pode influenciar as pessoas e a sociedade. E eu acrescento: positivamente, ou, neste caso, muito negativamente.


Fonte: Observatório da Imprensa


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